sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Poesia lírica sacra - A culpa e o arrependimento


Antes da apresentação do poema, vamos entender um pouco mais sobre a vertente religiosa de Gregório de Matos.
Seus poemas expressam a cosmovisão barroca: a insignificância do homem perante Deus, a consciência nítida do pecado e a busca do perdão. Ao lado de momentos de verdadeiro arrependimento, muitas vezes o tema religioso é utilizado como simples pretexto para o exercício poético, desenvolvendo engenhosos jogos de imagens e conceitos.

As idéias de Deus e do pecado, ao mesmo tempo que se opõem, são complementares. Embora Deus detenha o poder da condenação da alma, está sempre disposto ao perdão, por sua misericórdia e bondade; daí deriva Sua maior glória.

Conhecendo um pouco mais de Gregório de Matos






Quem foi


Gregório de Matos e Guerra foi um importante poeta colonial brasileiro do século XVII. Nasceu em 7 de abril de 1633, na cidade de Salvador (Bahia).

Vida e obras

Era de uma família rica, formada por empreiteiros e altos funcionários administrativos. Estudou num colégio Jesuíta da Bahia e depois continuou seus estudos na cidade de Lisboa e depois na Universidade de Coimbra, onde se formou em Direito. Neste país fez carreira de jurista.
Ao retornar ao Brasil, passa a viver de trabalhos na área jurídica, mas também começa sua dedicação à literatura. Passa a escrever sátiras sobre a sociedade da época. Em função de suas críticas duras aos integrantes da sociedade (políticos, religiosos, empresários) ganhou o apelido de “boca do inferno”. Também escreveu poemas de caráter erótico e amoroso.

As autoridades locais começaram a ficar descontentes com as críticas e passaram a perseguir Gregório de Matos. Preso em 1694, foi deportado para Angola (África).

Depois de um tempo, ganha a autorização para retornar ao Brasil. Porém, vai viver na cidade de Recife. Nesta cidade, faleceu em 26 de novembro de 1696 de febre que havia contraído em Angola.



Logo mais veremos seus poemas. Aguardem !

Afinal, o que é o barroco?




O tempo barroco denomina genericamente todas as manifestações artísticas dos anos 1600 e início dos anos 1700. Além da literatura, estende-se à música, pintura, escultura e arquitetura da época.

Mesmo considerando o Barroco o primeiro estilo de época da literatura brasileira e Gregório de Matos o primeiro poeta efetivamente brasileiro, com sentimento nativista manifesto, na realidade ainda não se pode isolar a Colônia da Metrópole. Ou, como afirma Alfredo Bosi: "No Brasil houve ecos do Barroco europeu durante os séculos XVII e XVIII: Gregório de Matos, Botelho de Oliveira, Frei Itaparica e as primeiras academias repetiram motivos e formas do barroquismo ibérico e italiano". Além disso, os dois principais autores - Pe. Antônio Vieira e Gregório de Matos - tiveram suas vidas divididas entre Portugal e Brasil. Por essas razões, neste capítulo não separaremos as manifestações barrocas de Portugal e do Brasil.

O estilo barroco nasceu da crise de valores renascentistas ocasionada pelas lutas religiosas e pela crise econômica vivida em consequência da falência do comércio com o Oriente. O homem do Seiscentismo vivia um estado de tensão e desequilíbrio, do qual tentou evadir-se pelo culto exagerado da forma, sobrecarregando a poesia de figuras, como a metáfora, a antítese, a hipérbole e a alegoria.

Todo o rebuscamento que aflora na arte barroca é reflexo do dilema, do conflito entre o terreno e o celestial, o homem e Deus (antropocentrismo e teocentrismo), o pecado e o perdão, a religiosidade medieval e o paganismo renascentista, o material e o espiritual, que tanto atormenta o homem do século XVII. A arte assume, assim, uma tendência sensualista, caracterizada pela busca do detalhe num exagerado rebuscamento formal.

Podemos notar dois estilos no barroco literário: o Cultismo e o Conceptismo.

Cultismo: é caracterizado pela linguagem rebuscada, culta, extravagante (hipérboles), descritiva; pela valorização do pormenor mediante jogos de palavras (ludismo verbal), com visível influência do poeta espanhol Luís de Gôngora; daí o estilo ser também conhecido por Gongorismo. No cultismo valoriza-se o "como dizer".

Conceptismo: é marcado pelo jogo de ideias, de conceitos, seguindo um raciocínio lógico, racionalista, que utiliza uma retórica aprimorada (arte de bem falar, ou escrever, com o propósito de convencer; oratória). Um dos principais cultores do Conceptismo foi o espanhol Quevedo, de onde deriva o termo Quevedismo. Valoriza-se, neste estilo, "o que dizer".
Na literatura, as características principais são:

Culto do contraste: o poeta barroco se sente dividido, confuso. A obra é marcada pelo dualismo: carne X espírito, vida X morte, luz X sombra, racional X místico. Por isso, o emprego de antíteses.

Pessimismo: devido a tensão (dualidade), o poeta barroco não tinha nenhuma perspectiva diante da vida.

Literatura moralista: a literatura tornou-se um importante instrumento para educar e para "pregar" por parte dos religiosos (padres).

Quem somos


Apresentação do Blog

Nesse blog buscamos levar um pouco da poesia barroca para todos os internautas, apresentando essa escola literária, destacando um dos seus principais escritores, Gregório de Matos enquanto na sua vertente religiosa. Aqui você vai encostar o pouco da historia do Barroco, a vida de Gregório de Matos, o que sua poesia religiosa representa e alguns dos seus poemas com sua interpretação.
Boa leitura!

Equipe do Blog:
Jéssica Linday
Ysla França
Ana Katarine
Aderbal Dantas

A. S. Francisco Tomando o Poeta o Habito de Terceyro - Gregório de Matos


A. S. Francisco Tomando o Poeta o Habito de Terceyro - Gregório de Matos

Ó magno serafim, que a Deus voaste
Com asas de humildade, e paciência,
E absorto já nessa divina essência
Logras o eterno bem, a que aspiraste:

Pois o caminho aberto nos deixaste,
Para alcançar de Deus também clemência
Na ordem singular de penitência
Destes Filhos Terceiros, que criaste.

A Filhos, como Pai, olha queridos,
E intercede por nós, Francisco Santo,
Para que te sigamos, e imitemos.

E assim desse teu hábito vestidos
Na terra blasonemos de bem tanto,
E depois para o Céu juntos voemos.

Compreendendo melhor o poema:

Neste poema, Gregório de Matos basicamente enaltece as qualidades de S. Francisco. Como na maioria do seus poema, ele pede a interferência dele para a sua salvação, fazendo com que ele siga os mesmo gestos de bondade e amor de S. Francisco.

Gregório de Matos - Ao Sanctissimo Sacramento Estando para Comungar


Gregório de Matos

Ao Sanctissimo Sacramento Estando para Comungar

Tremendo chego, meu Deus,
Ante vossa divindade,
que a fé é muito animosa,
mas a culpa mui cobarde.
À vossa mesa divina
como poderei chegar-me,

se é triaga da virtude,
e veneno da maldade?
Como comerei de um pão,
que me dais, porque me salve?
um pão, que a todos dá vida,
e a mim temo, que me mate. 
Como não hei de ter medo
de um pão, que é tão formidável
vendo, que estais todo em tudo,
e estais todo em qualquer parte? 
Quanto a que o sangue vos beba,
isso não, e perdoai-me:
como quem tanto vos ama,
há de beber-vos o sangue? 
Beber o sangue do amigo
é sinal de inimizade;
pois como quereis, que o beba,
para confirmarmos pazes? 
Senhor, eu não vos entendo;
vossos preceitos são graves,
vossos juízos são fundos,
vossa idéia inescrutável.
Eu confuso neste caso
entre tais perplexidades
de salvar-me, ou de perder-me,

   só sei, que importa salvar-me. 
Oh se me déreis tal graça,
que tenho culpas a mares,
me virá salvar na tábua
de auxílios tão eficazes!
É pois já à mesa cheguei,
onde é força alimentar-me
deste manjar, de que os Anjos
fazem seus próprios manjares:
Os Anjos, meu Deus, vos louvem,
que os vossos arcanos sabem,
e os Santos todos da glória,
que, o que vos devem, vos paguem. 
Louve-vos minha rudeza,
por mais que sois inefável,
porque se os brutos vos louvam,
será a rudeza bastante.
Todos os brutos vos louvam,
troncos, penhas, montes, vales,
e pois vos louva o sensível,
louve-vos o vegetável,

Compreendendo melhor o poema:

Nesse clássico poema religioso de Gregório de matos, temos o maior medo do homem barroco expresso: o medo de morrer sem o perdão divino. Ele relata no poema sua ignorância e falta de compreensão sobre alguns atos divinos, porém no final ele perde o perdão alegando sua ignorância. Durante o poema podemos ver o conceptismo, pois o poeta faz perguntas para argumentar.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Buscando a Cristo por Gregório de Matos

Gregório de Matos

Buscando a Cristo

A vós correndo vou, braços sagrados,
Nessa cruz sacrossanta descobertos
Que, para receber-me, estais abertos,
E, por não castigar-me, estais cravados.

A vós, divinos olhos, eclipsados
De tanto sangue e lágrimas abertos,
Pois, para perdoar-me, estais despertos,
E, por não condenar-me, estais fechados.

A vós, pregados pés, por não deixar-me,
A vós, sangue vertido, para ungir-me,
A vós, cabeça baixa, p'ra chamar-me

A vós, lado patente, quero unir-me,
A vós, cravos preciosos, quero atar-me,
Para ficar unido, atado e firme.

Compreendendo melhor o poema:


Como na maioria dos poemas barrocos de vertente religiosa neste podemos ver claramente em tudo seu curso a dualidade. O poeta associa a cada parte do corpo crucificado uma ação dele. Ao mesmo tempo que os braços de Cristo  estão abertos para ele receber, estão cravados para o castigar. Ao mesmo tempo que seus olhos estão abertos  para o perdoar, estão fechados para o castigar. Seus pés estão pregados para o não deixar, seu sangue para o ungir e a cabeça baixa para Cristo o chamar. No fim do poema ele revela o desejo de sempre está junto de cristo.


Neste poema podemos ver o clássico conflito do homem barroco que sempre busca a salvação, mas não deixa de pecar. Por isso nos seus poemas , Gregório sempre envolve o amor de cristo.


A Jesus Cristo Nosso Senhor - Gregório de Matos


A Jesus Cristo Nosso Senhor 

Gregório de Matos


Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado,
Da vossa alta clemência me despido;
Porque quanto mais tenho delinqüido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado.

Se basta a vos irar tanto pecado,
A abrandar-vos sobeja* um só gemido:
Que a mesma culpa que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.

Se uma ovelha perdida e já cobrada
Glória tal e prazer tão repentino
Vos deu, como afirmais na sacra história,

Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada,
Cobrai-a; e não queirais, pastor divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.

* Sobeja: basta.
Compreendendo melhor o poema:

Nesse soneto de Gregório de Matos vemos a clara situação que o homem barroco vivia: querendo a salvação, mas não deixando de aproveitar a vida. Ele viveu no período de transição entre a teodiceia e antropodiceia o que o deixa nesse conflito. Ele fala a Cristo que pecou e mesmo tendo pecado basta só que Cristo o coloque de volta em seu caminho  e ele será salvo. Caso isso não seja feito, Cristo perderá toda a gloria, pois não terá conseguido o resgatar do mal.